Pelos, gênero e racialidade

HybrydA
3 min readFeb 24, 2021

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Em uma pesquisa rápida sobre “origem da depilação”, aparecem muitas páginas de lojas de depilação que trazem dados sobre como ela é uma prática cultural em alguns povos e encerram com “hoje em dia, além de preocupação estética, a depilação é também um hábito de higiene pessoal. O avanço tecnológico permitiu que a técnica fosse aperfeiçoada cada vez mais, desde a origem da depilação. Sem contar que os métodos de remoção dos pelos são muitos. A depilação a cera é uma das mais procuradas e seguras. Principalmente quando as mulheres se depilam em um instituto de segurança.”

Foi bem mais difícil encontrar material que fale sobre a remoção dos pelos como uma tecnologia de controle e de marcação de gênero. Encontrei um texto interessante da revista AzMina.

“Historicamente, pelos ajudaram a definir masculino e feminino como opostos. Enquanto para os homens pelos simbolizam poder e virilidade, sua ausência para mulheres simboliza feminilidade e fragilidade na maioria das culturas ocidentais. Na Europa, por exemplo, o excesso de pelos em mulheres já foi associado à bruxaria, insanidade e descontrole sexual.

Para as mulheres ocidentais, relata Breanne (professora de Estudos de Gênero na Universidade do Arizona, nos Estados Unidos), a imposição da remoção de pelos vem com força total depois da década de 20, com o incentivo de campanhas publicitárias e as mudanças nas roupas, com maior exposição das axilas e pernas.

“Excluindo as breves rebeliões dos hippies e das feministas entre os anos 60 e 70, as regras de remoção de pelos permanecem. Atualmente, feministas argumentam que a ausência de pelo, especialmente na região genital, significa que as culturas ocidentais enxergam a emancipação feminina como ameaçadora e respondem erotizando a juventude”, diz Breanne”

“Aline Oliveira, médica do Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde, em São Paulo, avalia que a preferência por uma região genital depilada advém das imposições estéticas e do maior acesso a lâminas ou outras técnicas de depilação, mas destaca o papel da pornografia na construção deste padrão de beleza.

“A prática sexual da pornografia virou uma espécie de norma e nisso, certamente, a genitália sem pelos entra como regra para as gerações que consomem mais pornografia. A genitália padrão da pornografia é rosada, pequena e sem pelos, que é o comum das mulheres que ainda não entraram na puberdade, estabelecendo um padrão, muitas vezes, pedófilo das preferências sexuais”, alerta Aline”

(“Depilação: Existe machismo em cada pelo que arrancamos?” — revista AzMina)

Acho relevante ressaltar que a maioria dos dados que falam sobre a relação de opressão estabelecida com retirada dos pelos diz respeito a uma história branca. Curiosamente, mesmo assim os corpos não-brancos são mais marcados pelo estigma, o que a professora Breanne conclui com seu experimento, em que mulheres cis ficaram cerca de 2 anos sem se depilar: “a professora conta ainda que as reações também intensificaram preconceitos de classe e de raça. Mulheres negras e hispânicas e trabalhadoras relataram muito mais punições sociais por não se depilarem do que mulheres brancas ou de classes sociais mais altas.”

Não encontrei materiais sobre a relação de corpos trans ou intersexo e pelos/depilação. Acredito que seja muito importante que esse diálogo seja feito a partir de suas perspectivas, principalmente das existências femininas, para que se possa compreender as diversas exigências e tensões que rondam suas corporalidades em uma sociedade transfóbica e interfóbica.

Referências: https://azmina.com.br/reportagens/depilacao-e-machismo/

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HybrydA

escritos contra-coloniais sobre gênero, afeto, sexualidade e corpo. inspirações ancestrais e feministas/ indígena diaspórica, estudante de psicologia, poliversa